O uso da 'cura pela fé' com finalidade de obter lucro foi alvo
da justiça paraibana da cidade de Conceição, no Sertão do estado, distante 482
quilômetros de João Pessoa.
Esta semana, o juiz da Comarca do município, Antônio Eugênio,
condenou um grupo formado por cinco pessoas lideradas por Ricardo de Oliveira,
conhecido como 'Professor Saturno'. Além de condenar os réus, ele determinou
que os objetos utilizados pelo grupo fossem incinerados.
A sentença condenou o grupo por formação de quadrilha, extorsão
e falsificação de produtos terapêuticos. Professor Saturno teve pena de 15 anos
de reclusão e os demais acusados, João Alves de Paula Filho, José Ferreira
Xavier, Airon da Silva Gomes e Mauro Sérgio Medeiros de Assis, pegaram sete
anos e quatro meses.
A condenação dos réus, divulgada na segunda-feira (14) criou
polêmica sobre dois temas no município: a questão do respeito aos cultos
afro-brasileiros e o charlatanismo, através do uso da boa fé das pessoas para
obtenção de lucro.
De acordo com a decisão do juiz paraibano, o réu agiu com dolo,
ou seja, com intenção de enganar, e causou transtornos psicológicos às vítimas,
pessoas humildes e de boa fé.
O grupo foi detido durante uma operação das polícias Militar e
Civil em 2007, quando foram apreendidos computadores, veículos e uma quantia de
R$ 9.350. Segundo as investigações, os acusados agiam num local chamado de
'centro esotérico' e aplicariam golpes usando a cura pela fé.
A solução de todos os problemas, inclusive enfermidades, era
prometida às pessoas, cujas consultas custavam R$ 50. Os chamados trabalhos
espirituais, com o uso de ervas, banhos e velas, chegavam a custar até R$ 2
mil. O grupo divulgava os 'serviços espirituais' através de site na web,
rádios, programa de televisão e telefone.
O advogado dos réus, Joaquim Lopes, informou que o grupo irá
recorrer da decisão judicial e os condenados aguardaram o julgamento em
liberdade.
Cultura Afro-brasileira
Após a sentença condenatória, o juiz Antônio Eugênio determinou
que os objetos apreendidos fossem incinerados. A queima dos utensílios
esotéricos, como velas, óleos e pequenas esculturas, aconteceu nessa
quarta-feira (16).
A decisão do juiz de incinerar os utensílios da cultura
afro-brasileira, no entanto, não foi aprovada pela presidente da Federação dos
Cultos Afro-brasileiros de João Pessoa, Mãe Penha de Iemanjá.
Na opinião dela, os objetos em si não representam charlatanismo
e o ato de queimá-los só incentivaria o preconceito às religiões
afro-brasileiras. "Aprovo a decisão da justiça de condenar pessoas que
usam a boa fé e os preceitos dos cultos afro com fins malignos e com intenção
de ganhar dinheiro com a boa fé dos outros, mas os objetos em si não
representam isso. Eles poderiam ter sido doados", ratificou.
Mãe Penha de Iemanjá lembrou que os cultos das religiões
afro-brasileiras praticam o bem e fazem parte da cultura do país e reforçou
que, infelizmente, no Brasil, existem pessoas que usam dessa cultura para
denigrir, deturpar, fazer coisas do mal e ainda obter lucros indevidos usando a
boa fé.
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Juiz |
"Esse tipo de gente deve ser combatida sim, para que os
conseitos da cultura e da religiosidade afro-brasileiras seram revistos e o
preconceito seja transformado em respeito", opinou.
Quanto à questão da cobrança nos cultos afro, Mãe Penha disse
que elas nunca devem ser exorbitantes e que os seguidores das crenças devem
pagar aquilo que podem e não quantias pré-estipuladas.
"Claro que as mães e pais de santo precisam pagar luz, água
e as despesas do centro de cultos, mas os recursos devem partir das pessoas que
querem ajudar e da forma como podem", ressaltou.
Portal Correio